O Sindicato dos Peritos Oficiais e Auxiliares do Paraná (SINPOAPAR) informa, com pesar, o falecimento do perito criminal aposentado Arlindo Moreira Blume. Ele morreu nesta quinta-feira, 2 de dezembro, aos 70 anos, vítima de infarto.
Arlindo, o Didi, foi filho de Arlindo Orlando Arthur Blume, que dá nome ao Instituto de Criminalística de Curitiba. O sepultamento ocorreu no final da tarde desta sexta-feira, 3 de dezembro, no Cemitério Vertical, na capital paranaense.
Neste momento de dor pela passagem repentina, o sindicato se solidariza com familiares, amigos e todos que conviveram com ele no dia a dia do trabalho pericial. Também expressamos nossas sinceras condolências pela perda. Abaixo, reproduzimos um artigo sobre criminalística redigido por Didi e publicado na página do IC.
Alexandre Guilherme de Lara
Presidente do Sinpoapar
O termo “CRIMINALÍSTICA”, lançado em fins do século passado com HANS GROSS e a escola alemã em toda a sua complexidade, compreende “… não somente o estudo dos vestígios concretos, materiais do crime – objeto da técnica policial – mas também o exame dos indícios abstratos, psicológicos do criminoso, na medida em que esta ciência pode ser distraída da psicologia geral, considerando que a investigação judiciária, para a descoberta do autor de um crime, utiliza freqüentemente os primeiros e não pode desprezar os outros. Sem dúvida, afirma VIOTTI, o estudo metódico da técnica policial, representado pela descoberta, reunião e apreço das provas materiais do delito, não é menos complexo no ponto de vista da investigação criminal do que o exame das provas relativas à pessoa do delinqüente”.
HANS GROSS nasceu na Áustria, em Graz, a 26 de dezembro de 1847 e faleceu em 09 de dezembro de 1915. Estudou Direito e no início foi juiz de instrução, tendo exercido este cargo por algum tempo na região da alta Estiria.
Foi também promotor de Justiça e, a partir de 1890, professor de Direito Penal em Czemowitz. Em 1903, lecionou a mesma disciplina em Praga e desde 1905, na Universidade de Graz.
GROSS é reconhecido como fundador da Criminologia e também da Criminalística, termo por ele criado. Reconheceu desde cedo, no exercício profissional, a completa ineficiência dos métodos de investigação então empregados na polícia de sua terra natal. Como tais métodos dependessem de informantes e confissões, os resultados geralmente eram obtidos pelo castigo corporal e pela tortura.
THORWALD, discorrendo sobre a formação de GROSS como magistrado, ressalta:- Verificou que deviam ser feitos alguns trabalhos de investigação, e que esses trabalhos cabiam ao juiz de instrução. Embora tivesse estudado uma série de livros de textos legais na Universidade, nada aprendera sobre Criminologia. Por outro lado, diferentemente da maioria dos juízes daquele tempo, tinha imaginação. Percebeu claramente que a Criminologia deveria ter novos fundamentos; era necessário começar de novo, com novas idéias e usar técnicas científicas modernas. Como advogado, nada sabia de ciências puras e aplicadas. Começou a estudar todos os livros e revistas que podia obter e logo chegou à conclusão, que quase todas as novas realizações da tecnologia e da ciência podiam ser utilizadas, com vantagem, na solução de casos criminais. Pôs-se a aprender química, física, botânica, zoologia, microscopia e fotografia. Durante vinte anos trabalhou em silêncio, reunindo conhecimentos e experiência, resumidos num livro que foi o primeiro manual de criminologia científica e que tornou o nome de GROSS conhecido em todo o mundo “.
Trata-se de uma obra clássica, editada em 1893, sob o título “Handbuch für Untersuchunbsrichter” (Manual para Juízes de Instrução), muitas vezes reeditada e traduzida para vários idiomas. A segunda edição, que data de 1895, foi traduzida para o russo, espanhol, francês e inglês. A partir da 3ª edição, lançada em 1898, GROSS acrescentou à sua obra o sub-título “Als System der Kriminalistik” (Como Sistema de Criminalística). A 4ª edição apareceu em 1904 e foi traduzida para o italiano pelo Professor MÁRIO CARRARA, da Universidade de Turim, com aditamentos autorizados pelo autor e sob o título “Guia Prático para a Instrução de Processos Criminaes”.
A versão italiana foi traduzida para o português e publicada em Portugal no ano de 1909. A 5ª e 6ª edições datam de 1907 e 1913, respectivamente. Segue-se a 7ª edição que veio a lume em 1922, já após a morte do autor, sob os cuidados do Procurador Geral ERWIN HÖPLER, de Viena. A 8ª edição deste manual apareceu após o término da Segunda Guerra Mundial, em fascículos, tendo sido revisada e complementada pelo Professor ERNST SEELIG que, além de colaborador de GROSS, foi também o seu sucessor na direção do Instituto de Criminologia da Universidade de Graz.
O “Manual para Juízes de Instrução” havia sido complementado em 1898 pelo próprio autor, com a obra “Die Kriminal Psychologie” (A Psicologia Criminal) e ampliada novamente com a “Coletânea de Temas Criminalísticos”.
HANS GROSS criou ainda em 1899, o “Arquivo de Antropologia Criminal e de Criminalística” (Archiv für Kriminal-Antropologie und Kriminalistik) que, em junho de 1944, já contava com 114 volumes.
Tais obras proporcionam aos criminalistas atuantes e aos peritos criminais, preciosas informações no âmbito geral da Criminologia e também da Criminalística.
Como professor notável de direito penal, saído da prática da procuradoria e da judicatura, dotado predominantemente de talento para as ciências positivas, HANS GROSS é reconhecido mundialmente como fundador da Criminologia e da Criminalística.
Entre outros vultos da moderna investigação criminal, destaca-se o nome de EDMOND LOCARD, um dos pioneiros da Criminalística na França. Seus métodos são universalmente reconhecidos e lhe valeram a alcunha de “Pai da Moderna Criminologia”.
Filho de uma família abastada e culta, EDMOND LOCARD nasceu em Saint-Chamond a 13 de dezembro de 1877. Cursou o Colégio dos Dominicanos em Oukkins e bacharelou-se em Ciências e Letras. Estudou Medicina a conselho do seu pai, mas sob a influência de sua mãe, que afirmava que nenhum homem seria completo sem conhecimentos jurídicos, estudou Direito e alcançou o grau de licenciatura.
De uma cultura extraordinária, adquirida pela leitura de uma variedade de assuntos, os seus vastos conhecimentos se estenderam a todos os domínios da atividade humana. Além do vernáculo, falava fluentemente cinco línguas, lia sem dificuldade onze idiomas estrangeiros, inclusive o sânscrito e o hebraico.
A par de grande filatelista, LOCARD se interessava também pela grafologia, música, arte e botânica e, sobretudo, pelos seres humanos.
Até os trinta e três anos, não havia ainda se dedicado a uma profissão regular. Foi orientado para a Medicina Legal por JEAN ALEXANDRE LACASSAGNE, legista famoso na época e que fora um dos seus mestres na Faculdade de Medicina.
Doutorou-se em 1902, apresentando a tese “La medicine legale sous le Grand Roy, publicada sob o título La Medicine Judiciaire en France ou XVII Siécle”.
Apaixonado não só pelos assuntos relacionados à Medicina Legal, mas também pelos problemas dos criminosos habituais e dos indícios deixados pelos delinqüentes nos locais de crime, LOCARD passou a estudar inúmeras obras de Criminologia e fez contato com peritos renomados na época. Viajou por diversos países europeus, à busca de novas técnicas de investigação criminal, as quais, desde logo, divulgou através de conferências e publicações.
Tornou-se discípulo de RUDOLPH ARCHIBALD REISS, mestre famoso e criador do Instituto de Polícia Científica da Universidade de Lausanne. Foi aluno de ALPHONSE BERTILLON, insigne criador da chamada “Fotografia Sinalética” e do “Sistema Antropométrico de Identificação”, conhecido como “Bertillonage” e que se irradiou para o mundo, a partir do Serviço de Identidade Judiciária da Prefeitura de Polícia de Paris.
Com o desígnio de agora pôr em prática tudo o que aprendera, EDMOND LOCARD procurou o Chefe de Polícia Regional de Lyon, HENRY CACAUD, solicitando sua ajuda, para que pudesse organizar – algo inédito – um serviço que contasse com uma equipe permanente de cientistas, que empregassem todos os recursos de sua sabedoria, em busca de meios para detectar o crime. LOCARD era inteligente e persuasivo. CACAUD convenceu-se dos seus argumentos e deu-lhe uma oportunidade, cedendo-lhe duas pequenas peças de sótão, sob os beirais do telhado do Palácio da Justiça.
Foi assim que, a 10 de janeiro de 1910, realizava-se o sonho de LOCARD, com a criação do “Laboratório de Polícia” ou, segundo outros, do “Laboratório de Polícia Técnica” de Lyon, o primeiro do gênero em todo o mundo.
Os estudos realizados por LOCARD sobre as impressões digitais, levaram-no a demonstrar em 1912, que os poros sudoríparos que se abrem nas cristas papilares dos desenhos digitais, obedecem também aos postulados da “imutabilidade” e da “variabilidade”; criou assim a técnica microscópica de identificação papilar a que deu o nome de “Poroscopia”.
No domínio da documentoscopia, LOCARD criou o chamado “Método Grafométrico”, baseado na avaliação e comparação dos valores mensuráveis da escrita. Apresentou notáveis contribuições no tocante à falsificação dos documentos escritos e tipográficos , ao grafismo da mão esquerda e à anonimografia. Interessou-se, além do mais, pela identificação dos recidivistas, publicando artigos e obras neste domínio.
Tudo o que o insigne mestre estudou no campo da Criminalística, aliado à sua experiência pessoal, achava-se exposto em sua obra clássica, o “Traité de Criminalistique”, em seis volumes, publicado entre os anos de 1931 a 1940. O resumo do que se contém nesta obra acha-se condensado no manual de “Technique Policière” cuja segunda edição foi traduzida para o castelhano, sob o título de “Manual de Técnica Policiaca”.
LOCARD dirigiu o Laboratório de Polícia Técnica de Lyon até o ano de 1950, quando se aposentou com um acervo de quarenta anos de trabalho ininterrupto. No dia de sua morte – 4 de maio de 1966 – aos 89 anos de idade, EDMOND LOCARD estava praticamente sem nenhum vintém, refere FRANÇOIS CORRE. Nunca aceitou um cargo público e os seus projetos de pesquisa consumiram quase toda a fortuna da família. Para equilibrar o seu orçamento nos últimos anos de vida, viu-se na contingência de vender, um por um, os selos raros de sua coleção e, para manter a sua equipe de colaboradores, inteirava com os seus próprios recursos, os escassos salários que o governo lhes pagava.
Foi um espírito eclético, uma personagem rara, segundo ALEXANDRE AMOUX, que finaliza dizendo:- “… o ser mais diversificado e completo que a Providência colocou no nosso caminho”.
Coube ao Dr. OTÁVIO EDUARDO DE BRITO ALVARENGA, ex-diretor do Instituto de Criminalística de São Paulo, fazer o necrológio de EDMOND LOCARD, no II Congresso Nacional de Criminalística, realizado em 1966, ocasião em que foi conferido ao finado, o diploma de Membro Honorário e a medalha deste certame.
Na sua produção científica, há a destacar a publicação de cerca de trinta obras especializadas, entre as quais o “Traité de Criminalistique”, “L’Expertise des Documents Écrits, ”Les Falsifications”, “La Police et les Méthodes Scientifiques”, “Technique Policière”.
Cumpre finalmente assinalar que EDMOND LOCARD foi agraciado com vinte e duas condecorações francesas e estrangeiras, entre elas a de Comendador da Legião de Honra. Além de fundador do Laboratório de Polícia Técnica de Lyon, figura entre os fundadores da Academia Internacional de Criminalística e dos conselhos técnicos da “INTERPOL”.
Que a vida e a obra de EDMOND LOCARD sirvam de exemplo e de estímulo à nova geração de Peritos Criminais que operam neste imenso país.
Até o início deste século (XX), não se cogitava ainda no Brasil da adoção de métodos científicos na investigação criminal através de instituições especializadas junto às organizações policiais.
Em 1913, por iniciativa do Dr. RAFAEL DE SAMPAIO VIDAL, quando Secretário de Justiça e Segurança do Estado de São Paulo, foi convidado o Professor RUDOLPH ARCHIBALD REISS, diretor do Laboratório de Polícia Técnica e titular da cátedra de Polícia Científica da Universidade de Lausanne, a fim de realizar uma série de conferências didáticas para as autoridades policiais daquele Estado. O Professor REISS, considerado na época um dos mais eminentes mestres da Policiologia, veio ao nosso país acompanhado do Dr. MARC BISCHOFF, que além de assistente-secretário, foi seu sucessor na cátedra e na direção do Laboratório de Polícia Técnica de Lausanne.
A estadia deste mestre de renome internacional no Estado de São Paulo e no Distrito Federal, onde também realizou excelentes preleções, foi das mais proveitosas, segundo informa MANOEL VIOTTI. Este autor salienta em seu comentário, o nome do Dr. VIRGÍLIO DO NASCIMENTO, que muito se distinguira nos cursos prelecionados, a ponto de captar a estima e consideração do mestre, que o levava em sua companhia para aperfeiçoar-se na Universidade de Lausanne.
Em 1925, fundou-se a Delegacia de Técnica Policial em São Paulo, a qual foi transformada no ano seguinte em Laboratório de Polícia Técnica, por iniciativa do Dr. CARLOS DE SAMPAIO VIANA, considerado um dos pioneiros do estudo técnico-policial no país.
Em janeiro de 1933, o Gabinete de Identificação do Rio de Janeiro, sob a direção do Professor LEONILDO RIBEIRO, eminente mestre da Medicina Legal, foi transformado num verdadeiro Instituto, ocasião em que também foi criado o Laboratório de Polícia Técnica e Antropologia Criminal, inaugurado no dia 20 de junho daquele ano.
Arlindo Blume, perito criminal